sábado, 13 de junho de 2009

Fogueiras juninas e Cristianismo

Com a evangelização da Europa, os cultos da Antigüidade à fecundidade e ao Sol, que aconteciam no dia do solstício de verão, foram integrados ao cristianismo.
Passaram a acontecer no dia 24 de junho, festa do nascimento de São João Batista. Essa escolha não foi feita ao acaso e guiada apenas pela efeméride, ou seja, a suposta natividade do santo em seguida à noite mais curta do ano no Hemisfério Norte. Na verdade, João, aquele que purificava os judeus pecadores no rio Jordão, representa os elementos que governam as cerimônias solsticiais, a saber, o fogo e a água.
Nos Evangelhos, João pronuncia as seguintes palavras: “Eu utilizo a água, mas aquele que vier depois de mim batizará com fogo”. Se os ritos ligados à água praticamente desapareceram, a tradição do fogo se manteve e permanece como o aspecto mais pagão dessa festa, ainda que tenha sido motivo de incômodo debate na hierarquia da Igreja.
O concílio do ano 452, por exemplo, reuniu os bispos da França e do norte da Itália em torno de alguns desafios, entre os quais agir contra os costumes pagãos. Atribuem-se a Santo Agostinho algumas prescrições anteriores ao concílio, visando fazer desaparecer as antigas superstições: “Que ninguém, na festa de São João ou em determinadas solenidades ligadas aos santos, se dedique a observar os solstícios, as danças e os cantos diabólicos”.
Mas as fogueiras, ainda que razoavelmente domadas pela cruz, permaneceram e se institucionalizaram na França medieval e na Europa moderna. Na verdade, o lado pagão da festa resistiu em outros aspectos na França, ainda que com a discreta desaprovação dos bispos.
À beira do rio Loire, promoviam-se por vezes banhos rituais, e barcas em chamas podiam ser vistas sobre as águas do rio. Na Alsácia, cultivava-se a tradição de beber o “orvalho de São João” para se purificar. As moças se enfeitavam com flores vermelhas para dançar em torno do fogo, isso a fim de melhor seduzir o futuro noivo. Subsistia ainda, no leste da França, o uso de guirlandas de palha, simbolizando o disco solar dos antigos. Eram lançadas em chamas, do alto de colinas, para fertilizar os campos.
Alguns usos e costumes medievais podiam ser encontrados em toda a Europa: fazer os rebanhos passarem através da fumaça dos braseiros da festa joanina supostamente os livrava de doenças no ano seguinte. Da mesma forma, esse ritual servia para proteger as crianças e curar os doentes.
No Brasil, a celebração do dia do nascimento de São João, 24 de junho, vem do período colonial e é o ápice da estação fria – a noite mais longa do ano, ou solstício de inverno, próxima dos dias que homenageiam também outros dois santos: Antônio (13 de junho) e Pedro (29). O sinal trocado do clima nunca foi empecilho para o calor da diversão, especialmente no Nordeste e no Norte brasileiros, onde o inverno traz frescor, raro em outras épocas – nos trópicos e na faixa ao sul do equador, vive-se o avesso dos rigores do Hemisfério Norte.
A Igreja Católica trouxe ao Novo Mundo a celebração de São João, nascida pagã, já cristianizada. De fato, a celebração, de forte identidade francesa, chegou ao Brasil já modificada pelos portugueses e aqui sofreu outras influências, especialmente de índios e negros.
Autor: Pierre Paillard (História Viva) [link morto]

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