sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O Deus social

As guerras particulares de El são para estabelecer sua liderança na família dos Deuses. Suas guerras são contra seu pai Samen (Céu) pelo bem de sua mãe perdida Ars (Terra), os dois, Céu e Terra, são os últimos pares teogônicos. El toma sua irmã por esposa e emascula seu pai. Os paralelos com a Teogonia de Hesíodo são próximos: Terra, pelo seu primogênito Céu gerou os grandes Deuses, entre eles Réia e Cronos. Foi Cronos quem, em defesa de sua mãe Terra, emasculou o Céu. Zeus, o filho de Réia e Cronos guerreou contra seus parentes e os venceu, prendendo-os no submundo. Similarmente, no mito de Kumarbi, ele emasculou seu pai Anu (Céu), que em seu tempo aprisionou seu pai Alalau no submundo. O mais extraordinário exemplo do que nós podemos chamar de motivo patricídio-incesto é achado em uma teogonia recentemente publicada. Através de seis gerações de pares teogônicos, o poder é passado através do patricídio e do incesto. Na Segunda geração, o jovem Deus Sumuqan mata seu pai, casa-se com sua mãe Terra e sua irmã Mar por cortesia. Mar também matou sua mãe e esposa rival Terra. Na terceira até a sexta geração o jovem Deus mata o patriarca (duplamente sua mãe também) e regularmente se casa com sua irmã (apenas na terceira geração ele se casa também com sua mãe). Na sétima geração o jovem Deus mantém seu pai cativo. [...]
A existência dessa forma barroca do padrão patricida e incestuoso dos mitos teogônicos deveria estabelecer de uma vez por todas a sucessão dos Deuses.[...] O padrão de violência na geração dos Deuses antigos acaba na transição aos grandes Deuses do culto, quem finalmente estabelece a paz.
Os mitos de El apresentam estruturas estáticas ou eternas que constituem a natureza e a ordem da sociedade patriarcal. [...] Na família cósmica dos Deuses o patriarca sempre fica entre o Deus velho (ou morto) e seu filho lascivo e ambicioso. Esta é a estrutura que o mito descreve, uma estrutura primordial. Os pares teogônicos mais velhos, ao menos de inicio, devem ser inevitavelmente incestuosos. Além do mais, a sociedade patriarcal criou modelos nos quais a tentação do incesto de um lado e a revolta contra o pai do outro constantemente ameaça a paz familiar.
Nós vemos El como a figura do pai divino[...] A única imagem de El que une todos seus mitos e o do patriarca. Ao contrário dos grandes Deuses que representam os poderes por detrás do fenômeno da natureza, El é em primeira instância um Deus social. Ele é o pai primordial dos deuses e dos homens, às vezes rígido, freqüentemente compassivo, sempre sábio no julgamento.
[...]
El é criador, o mais antigo, cujos extraordinários poderes procriativos populou o céu e a terra e há poucas evidências que seu vigor tenha diminuído. [...] El descansa agora das guerras antigas nas quais ele ganhou a autoridade patriarcal.[...] a principal esposa de El, a mãe dos Deuses, está ocupada com intrigas familiares. El aparenta afeto a ela, mas os textos do hiero gamos de El revelam que ele freqüentemente se volta para esposas mais jovens. Suas três consortes principais são sua duas irmãs Asherah e Astarte e sua filha Anat.[...]
Traduzido do livro Canaan Myth and Hebrew Epic, Frank Moore Cross, pg. 41 a 43.
Nota: Este é o trecho mais interessante do livro, pois El é, a grosso modo, o avô do Deus Cristão. Foi o ser humano, por vaidade e orgulho, que distorceu e adulterou os mitos primordiais e originais de seus Deuses, unicamente para atender a projetos e agendas pessoais. O resultado, para os povos e os reinos que o fizeram foi, invariávelmente, a destruição, a miséria e a escravidão.

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