quarta-feira, 13 de maio de 2015

Mithra Petra Genetrix

“Eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja”. [Mateus 16:18]
“Tirando-o da cruz, o envolveu nele, e o depositou num sepulcro lavrado numa rocha; e revolveu uma pedra para a porta do sepulcro”. [Marcos 15:46]
Os Evangelhos utilizam de muitos símbolos e simbologias místicas e esotéricas. Fenômeno e resultado de um processo histórico, o Cristianismo, como muitas religiões, foi sendo construído a partir de ensinamentos, pensamentos, doutrinas e iconografias das religiões existentes.
Como toda mitologia, os Evangelhos não podem ser lidos literalmente, mas pode-se ver perfeitamente que as noções de que pedra, rocha, caverna e túmulo estão interligados.
O culto de mistério de Mithra é o mito antigo mais conhecido e mais similar à simbologia cristológica. Para entender a simbologia da pedra, devemos entender o mito de Mithra.
Mithra é o personagem principal neste culto de mistério, derivado do Zoroastrismo, do Mazdeismo e do Zend Avesta. Este culto de mistério tem sua origem na Pérsia, o Zend Avesta tem uma origem Indo-Européia.
O problema é bem grande, quando falamos em Zoroaster, um reformador religioso que revolucionou as crenças originais de seu povo, que eram politeístas, em um culto monoteísta. O problema fica ainda maior, quando colocamos na equação que o culto a Mithra tornou-se conhecido no “mundo ocidental” graças às conquistas de Alexandre o Grande e depois da conquista da Grécia Antiga pelos Romanos. Registros e textos falando desse culto de mistérios chegaram devidamente helenizados ou romanizados, o culto a Mithra tornou-se um culto de grande influência no mundo Greco-romano por sua adoção pelos soldados romanos.
Nos textos sagrados do Mazdeismo, Mithra é identificado como o Divino Pastor e aquele que garante os juramentos, acordos, contratos e oferendas. Assim, Mithra exerce uma função similar ao de emissário de Ahruda Mazda [o Deus Supremo] e de medianeiro para o homem.
O culto de mistério desenvolvido em torno de Mithra foi um resquício de religiões que existiram antes de Zoroaster e seus elementos devem ser analisados dentro de uma visão teológica politeísta. O sacrifício do touro e o “nascimento” de Mithra de uma “rocha” são os símbolos que tem a presença mais constante neste culto de mistério. Quando a Pérsia sucumbiu diante das conquistas de Alexandre Magno, o politeísmo oculto no Mazdeismo se perdeu, bem como suas origens e mitos originais.
O sacrifício do touro, que foi assimilado e copiado por Gregos e Romanos, tinha muito mais do que uma importância social, tinha um significado místico e religioso. O touro é uma imagem constante nas religiões mais antigas, os Deuses antigos eram representados portando chifres de touro e eles eram descendentes de um Deus Touro antiquíssimo. Estas religiões antigas tinham o touro como simbologia em comum por terem surgido durante a Era de Touro, uma era ainda marcada por religiões e sociedade matrilineares, bem como a presença igualmente mundial de uma Deusa Serpente.
O sacrifício do touro assinalava a mudança da Era de Touro para a Era de Áries. Mithra era representado portando chifres de carneiro e, não coincidentemente, Cristo também porta a mesma simbologia. Esta simbologia está presente também na mitologia Grega, no mito de Teseu e do Minotauro. No mito de Teseu, o herói precisa entrar no labirinto para achar e matar o Minotauro. Esta é uma clara assimilação do culto de mistério de Mithra, que também precisa entrar em uma caverna para matar o touro. Aqui nós temos mais uma pista que nos leva para as religiões mais antigas que antecederam as religiões clássicas e as religiões monoteístas.
Na aurora da humanidade, os cultos aos Deuses aconteciam ou em florestas, ao redor de lagos ou de círculos naturais [nemeton], ou em montanhas e cavernas. Nas eras posteriores, conforme a religião foi se tornando mais urbanizada, os sacerdotes dos Deuses do período clássico construíram templos, uma pálida imitação da caverna primordial. A caverna era o templo primordial da Deusa Serpente, Deusa esta que, na forma de dragão, acaba sendo suplantada e superada por Marduk, Zeus, Apolo e Cristo. Não é mera coincidência que, dentro da caverna, o herói ou o Deus, teria que vencer e matar, ao menos simbolicamente, o touro que ali habitava. Dentro do espaço mais sagrado da caverna, a Deusa Serpente era defendida e guardada pelo Deus Touro. Evidentemente, os sacerdotes dos Deuses vitoriosos demonizaram o Deus Touro, omitiram e ocultaram a Deusa Serpente. Apenas em círculos mais secretos, se mantém o mistério de que os Deuses vitoriosos apenas tornaram-se o Deus Pai depois de terem copulado e casado com a Deusa Serpente.
Então a sequencia mais evidente do culto de mistério de Mithra é ele entrando na caverna, o encontro com o touro, o sacrifício do touro, a vitória de Mithra e então seu ressurgimento [renascimento] de dentro da caverna, ou rocha, ou pedra. A caverna era também representada por uma árvore ou um ovo [simbologias ligada à Deusa], mas ela também pode ser representada por uma tumba, um sepulcro. Por isso que Mithra é representado “nascendo” de uma rocha, homem feito, portando os símbolos de sua soberania sobre o mundo. Mithra não “nasceu”, mas renasceu, recebeu a iniciação e, depois que copulou com a Deusa, torna-se senhor do mundo.
Quando a Pérsia foi invadida por Macedônios e Romanos, estas conexões e simbologias ficaram perdidas. Os novos senhores do mundo, no entanto, não quiseram ou não puderam apagar as religiões antigas por completo. Novos tronos adotaram os Deuses vitoriosos dos mitos da Era de Áries, mas os resquícios dos mitos antigos sobreviveram, nos cultos de mistérios. Infelizmente, o culto de mistério de Mithra tornou-se uma mera imitação, foi adotado com júbilo entre os soldados romanos e tornou-se uma fraternidade militar. Em sua versão helenizada e romanizada, o culto recebeu cores belicosas, legiões cultuavam Mithra com a intenção de que, pela honra, pela virtude e pela vitória em batalha, o soldado renasceria como Mithra.
Por ter sido estruturado no meio militar, por ter ressurgido em outra cultura, patriarcal, sexista e misógina, o culto de mistério de Mithra, helenizado e romanizado, tornou-se um culto de mistérios masculino, excluindo qualquer presença ou participação do feminino, da mulher, da Deusa. Essa postura de que o masculino é superior ao feminino foi transmitido para as religiões monoteístas abraãmicas, bem como a supressão do feminino, da mulher, da Deusa. O mundo ocidental adotou a ideia de que Deus Supremo é o Deus da Guerra, esquecendo-se de inúmeras Deusas antigas que foram Supremas e Belicosas.
No mundo contemporâneo, o Paganismo Moderno tenta recuperar nossas verdadeiras origens e raízes. Da mesma forma como foi um erro divorciar o Deus abraãmico de sua Consorte, é igualmente um erro divorciar a Deusa antiga de seu Consorte. Da mesma forma como foi um erro dizer que Mithra “nasceu” de uma rocha, foi um erro dizer que Atena “nasceu” da testa de Zeus, como é um erro dizer que a Deusa antiga “nasceu” por partenogênese.
Pedras não engravidam nem podem dar à luz. A Deusa apenas pode engravidar e gerar o mundo com a presença de seu Consorte. Sem o Hiero Gamos o Universo não existiria.

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